As duas coragens
É tarde da noite.
O corpo, ainda agitado, acalenta-se.
Foram tempos guerreiros. Foram tempos difíceis.
Uma pausa avizinha-se.
Bem-vinda seja.
Aninhada no descanso por vir, medito sobre coragem.
Tema recorrente nos meus textos, algo tão pulsante em mim.
Mas sempre é tempo de novidades e esta semana aprendi sobre uma nova coragem.
Não aquela de empunhar causas e espadas, enveredando por matas virgens.
Nem aquela de ser a voz em meio aos que se calam ou a primeira mão a se levantar.
Estas são coragens do avanço. Da guerra, do pleito, das lutas.
Respeito-as.
Mas cobram um preço danado.
Esta nova coragem recém-descoberta é a coragem da retirada.
Engolir a palavra mais dura, por um bem maior que estar certa.
Dar um passo para trás, de onde sempre apreciamos melhor o quadro da vida célere.
Ser bastidor, ser humilde, ser quase transparente.
Só que não.
A força, a doçura, o sacrifício da retirada pode mover céus e terras.
É imprevisto.
Esperamos sempre um revide após o ataque.
Um golpe, após outro golpe.
Jamais a outra face.
Não estou falando de submissão, baixa auto-estima, humilhação.
Estou falando da compaixão maior, aquela para com quem não sabe o estrago do punhal no ar.
Resignificar a violência, do ponto de vista do amor.
Tenho as armas: o corpo desperto e teso; as palavras ferinas.
Mas meu olhar sobre o outro pode e deve ser maior que meu desejo de revanche, da última palavra, da justiça temporária.
Meu amor por mim deve ser maior.
Aprendo sobre esta nova coragem. Onde convido o outro a ser mais humano, portanto mais divino. Sendo o que é para ser.
Suave e precisa, o passo para trás que liberta.
A mim. A você.