Viver Mais Simples

Dizem que sou louca…

Meu último “por que não?” levou-me a um lugar mágico.  Fui ver a peça Nise da Silveira, Senhora das Imagens.
Conduzida pela alma sensível de minha grande amiga Lucrécia, enveredei por uma trilha de caminhos próprios corajosos, de arte e poesia.
Poderia falar muito sobre a  narrativa inspirada da vida de Nise da Silveira, uma guerreira amorosa por cuidados mais humanos com pacientes psiquiátricos. Ou do trabalho precioso da atriz-artesã Mariana Terra. Corpo multiforme. Expressão cravadora em nosso peito.
Poderia elogiar a luz sutil, o cenário preciso. Poderia fazer uma bela crítica teatral de um espetáculo diferente.
Mas não.

Prefiro falar do que assaltou minha alma, a ponto dos olhos encherem-se de lágrimas e o coração encher-se de  felicidade e espanto.

Fernando Diniz, Museu de Imagens do Inconsciente

Respeito ao legado
Acredito muito em honrar o caminho.  E o caminho de Mariana tem poesia e tragédia.  Seu pai, Rafaelle, liderou  a iniciativa “Andarilhos da Luz”, onde o teatro era caminho terapêutico para pacientes do Instituto de Psiquiatria. Morreu cedo demais e o projeto sofreu o golpe.  Mariana conta a história de Nise, mas também conta a história de seu pai, homem cuja história não está no Google.
Mariana escolheu recordá-lo evocando sua causa, costurando as histórias de Nise, dela e dele. Lindo de ver e muito valente. Uma história de amor pelas pessoas. Uma história de amor de filha.

Cair, levantar.
Tanto Nise como Rafaelle enfrentaram obstáculos impensáveis para levar adiantes seus projetos.  Mariana também tem sua cota de sustos.  No entanto, não se vê pouca alegria. Senti a energia, o desejo de prosseguir, a poesia de quem pisou descalça em espinhos, mas pensou em rosas.
Um projeto ousado e ao mesmo tempo singelo.
Conheci o camarim e lá estão as fotos do pai, mensagens carinhosas e referências à Nise.
Não é uma peça comercial, alavancada na saborosa biografia de uma mulher interessante.
É um presente para nós construído sobre o passado de gigantes.
Senti-me mais forte para prosseguir em minhas próprias lutas.

Quem é louco aqui?
A certa hora, Mariana/Nise pergunta: “O que é um louco?“. A plateia arrisca respostas e ela(s) nos devolvem: “não ouso definir a loucura”.
No final da peça, conheço duas figuras fascinantes e engreno num papo animado. Lá pelas tantas, contam-me, casualmente, que são “loucos”. Pressinto a tentação de julgar, assustar-me ou mudar meu  olhar. Resisto, inspirada pela experiência da peça. Afinal, quem é louco? Acredito que viver uma vida convencional, sem sentido próprio, sem aventura… Esta é de fato uma loucura bem grande.

Saio de coração expandido e mais alerta.  Deixemos nossos preconceitos, nossas velhas crenças. De tudo, o que vale é o amor experimentado e praticado. Amor de quem trabalha para os outros. Amor de quem dá valor a suas raízes.

Eu recomendo MUITO a todos.  Vão conhecer Mariana e seu trabalho. E é bem provável que conheçam um pouco mais de si mesmos…

Centro Cultural Correios
Rua Visconde de Itaboraí, 20, Centro, Rio de Janeiro
Até 23 de outubro de 2011
Quinta a domingo, 19h

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