Dois ouvidos e uma boca
Meu caminho próprio tem sido pontilhado de descobertas maravilhosas, novos fazeres e saberes.
Minha maior surpresa são as novidades que pensava estarem fora do meu alcance ou ao menos, muito distantes.
Ouvir é uma destas novidades. Novidade com sentido de uma nova habilidade.
De fato minha capacidade de escutar progrediu muito no último ano e meio. E há muitas possibilidades de ouvir:
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Ouvir o coração
Antes eu não sabia, mas hoje sei. Quando decidi mudar o jogo da minha vida, eu escutei um chamado profundo do meu coração. Quando senti uma voz surda gritar “não dá mais, chega”. Quando uma súbita serenidade me permitiu contar este desejo para todos que precisavam saber. E eles se convenceram (meu marido, minha chefe, os amigos necessários), pelo menos o suficiente para eu ter apoio nos primeiros e duros degraus.
Aprendi a distinguir o chamado do coração da paixão volátil. Ouvir algo além do impulso, do destempero, do vulcão fora de controle. Um tum tum tum mais sutil, igualmente eloqüente.
Ouvir o corpo
Se eu fosse desenhar o meu ontem, seria um corpo pesado com uma enorme cabeça. Eu era escrava desta cabeça.
Sim, ela me serviu. Teceu argumentações incríveis, conclusões irrefutáveis. Teceu uma realidade onde eu tinha muita razão, muita certeza e brigava por isso.
Aos poucos, venho cultivando meu novo corpo, mais equilibrado. Primeiro, as caminhadas, reeducando meus pés. Depois, o primeiro emagrecimento. Quase dez quilos em três meses. Desinchando das tristezas, do nervosismo, das raivas.
Então a retomada do Pilates. Reensinando meu abdômen a ser o centro, sustentando as costas, agüentando novos pesos. Exercitando uma nova flexibilidade.
Esta foi a primeira fase.
Agora o trabalho é mais sutil, através da Psicologia Formativa pelo Roda de Mães e Workshops da Adriana Ferreira. Trabalhado lado a lado com minha terapeuta corporal. E, cada vez mais, fruto de um autoconhecimento de quem sou através do meu corpo.
Hoje mapeio melhor as minhas dores e suas impressões em mim. Se grito, sinto a garganta ardida. Se estou cansada, sinto uma fisgada na barriga. Se estou ansiosa ou brava, sinto uma gastura no peito.
Quando estou feliz em ajudar alguém, sinto um espasmo por dentro. Quando é hora de dizer algo para o outro, vindo de não sei onde… É como um peixe pulando de dentro de mim.
Sinto tudo isso e, aos poucos, vou aprendendo a ler os sinais e traduzir em ação.
Ouvir o outro
Eu não costumava me lembrar de nada que os outros falavam. Nem das palavras e nem dos combinados.
Agora me lembro de frases inteiras. Hoje me esforço bem mais em fazer boas perguntas do que trazer respostas brilhantes. Isto mudou em mim.
O resultado é extraordinário. O outro me ensina tanto e sempre. Hoje está claro que eu não crio soluções para meus clientes, eu apenas traduzo sentimentos e noções que pesco em cada um.
Minha capacidade de ouvir ampliou a relevância do meu trabalho, permitindo um servir mais fértil.
Ouvir o que não foi dito
Finalmente, uma centelha que já existia e agora se multiplica de forma mais constante, consciente e elaborada.
Quando falo com as pessoas, palavras pulam de dentro de mim (o tal peixe de que falei lá em cima). Não sei explicar, mas é como se o coração das pessoas falasse dentro do meu. Eu sei quando acontece porque os olhos do outro ficam repentinamente enevoados, seguidos de um silêncio, testemunho de que nossos corações comungaram.
Ainda estou compreendendo todas as nuances desta minha “habilidade” e respeito demais esta nova forma de conexão com o outro.
Por que tens boca, cala
O desafio agora é saber falar o suficiente. Se estou cansada, falo. Se estou entusiasmada, falo. Se estou mal-humorada, falo. Se estou eufórica, falo.
Aprender a calar é a próxima etapa desta evolução.
E assim estou. Já aprendi a ouvir, agora aprendamos a calar.
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