O fato é que ser pai/mãe tem mais coisas em comum do que se supõe a princípio, penso eu. Nessa nossa sociedade tão voltada para as diferenças de gênero (feminismo, meninos são assim, meninas são assado, o novo papel do homem na modernidade e outros etc.), compartilhar uma condição pode ser extremamente construtivo para um casal. Há aquele velho provérbio africano que diz que é preciso todo um vilarejo para se criar uma criança. Bom, pelo menos um casal ajuda bastante, ressalvadas as configurações específicas de família presentes e totalmente possíveis.
E se discutir a relação virou clichê negativo, discutir a visão dos pais (e avós, e tios, e babás, e escolas, e grandes amigos, ói nós aqui palpitando) de como lidar com crianças (outra vez o inglês e suas vantagens – os verbos para criar filhos [raise, grow] dão idéia melhor do sentido de permitir que cresçam, elevem-se) é fundamental. É mais simples ajustar a sintonia das visões fora das vistas e dos ouvidos da criança e aplicar em conjunto os mesmos princípios.
Mas o que eu acho fundamental mesmo é a confiança em si. Os pais e as mães nascidos (e criados) nessa era superanalisada, supercompetitiva, supercheia de manuais (1001 vinhos para beber antes de morrer, 1001 maneiras de trocar a fralda do seu filho etc.), precisam, por necessidade de sobrevivência, ler tudo, ouvir tudo, depois respirar fundo e jogar tudo que não for bom-senso fora. E bom-senso não vem em manuais. Constrói-se a cada vivência, a cada conversa, a cada leitura, a cada vez que você olha seu filho nos olhos e sabe. No fundo (e no raso também) criar “bem” um filho é viver bem. E viver bem não tem receita. Sabemos no entanto, geralmente por experiência própria, que a culpa, a cobrança excessiva e a rigidez ou desleixo desmedidos não ajudam.
Bom, vocês devem se perguntar, então o cara vem aqui, pega o espaço da dona do blog, cria toda uma expectativa, pra dizer que o segredo do lance da parada do bagulho é o equilíbrio e estar bem consigo mesmo e essas paulocoelhadas todas? Sinto muito, mas é isso mesmo. Tudo que me vem na cabeça sobre o assunto é clichê, lugar-comum. Mas vamos em frente.
Estabelecer uma comunicação com seu filho (clichê). Pra mim, passa por olhar bem pra ele e vê-lo como um outro, uma pessoa, diferente de você, semelhante de você, como diria Arnaldo Antunes. Pode ser meio difícil, por que a gente tem esse negócio de genética, geração de filhos, puxou ao Tio Fulaninho, é igualzinho à beltraninha quando tinha essa idade, olha só o gênio, coisa de menino, coisa de menina, é a fase etc muito presente na cabeça. Sugiro duas linhas:
1) Se você não é muito chegado a filosofias espiritualistas, e vai mais pelo lado da cidadania, pense em seu filho como um pequeno cidadão, com direito a pensar as coisas do jeito dele, e lide com ele assim, sem esquecer que os cidadãos têm regras para o convívio em sociedade. E que a democracia entre pais e filhos é um pouco diferente. Mas respeite o ponto de vista dele, negocie, construa o consenso (clichêêêê)
2) Se você acha que seu filho é um ser eterno, cuja existência preexiste e transcende a esse estágio de seu filho, fica mais fácil, embora a responsabilidade continue a mesma.
Observe. Observe mais um pouco. Escute. Escute mesmo. Absorva o que viu e ouviu. Reflita sobre o que viu e ouviu. Só então interprete como é seu filho em cada situação, respeite o jeito dele de ser, mas, atenção, não abra mão de orientá-lo e modificar a atitude dele de acordo com seus próprios valores! E isso não é desrespeito à individualidade dele, cebolas! Vem com o pacote da paternidade. E faz filhos mais felizes, logo pais também. Simples assim.
E pra ser contraditório com o que disse no início (o que aliás é um bom exercício de flexibilidade mental), ter uma filha é bem diferente de ter um filho, assim como é diferente ser mãe ou pai. Só acho que isso não pode ser explicação nem limitação pra tudo. Eu digo pra minha filha: “deixa pra lá, sabe como são os meninos…” e coisas assim. Mas procuro não cristalizar demais essa visão dominante na sociedade, porque acho que atrapalha os relacionamentos passados, presentes e futuros, empobrece a convivência, limita a criatividade e põe em risco a aceitação do outro, pra nem falar na tolerância.
Resumindo o post: calma, e sai pra lá culpa. Lembrando que o ensinamento cristão é amar ao próximo como a si mesmo, e não amar mais do que a si mesmo. Fazer tudo pelos filhos é ótimo, mas façamos primeiro por nós. A gente vai errar muuuito, mas, o que é errar mesmo? Ah, é o pressuposto de aprender. Tá bom então.
Confesso que penso muito nessa história de paternidade, mas nem tanto assim. Pra mim é meio natural. Deve ser o tal instinto materno… E a minha filha ajuda bastante, modestamente. Vejam aí, com trilha sonora de Zizi Possi, canção de José Miguel Wisnik, em homenagem ao espaço cedido aqui nesse sítio, Mais Simples.
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